Um colaborador que realiza apenas seu trabalho, sem extrapolar horas, alavancar grandes projetos ou assumir tarefas desafiadoras é um colaborador consciente ou preguiçoso?
O fenômeno, intitulado Quiet Quitting, tem sido febre nas redes e cada vez mais incide no dia a dia de trabalho dos colaboradores. Mas não só deixa suas marcas nas rotinas de trabalho, como também intimida lideranças que o veem como um reflexo do baixo engajamento de suas pessoas lideradas.
Neste artigo falaremos sobre o fenômeno, suas origens, incidência real no trabalho e como agir sobre ele, evitando o baixo engajamento com estratégias de EX.
Siga a leitura e saiba mais.
O que é Quiet Quitting?
Surgido nas redes sociais (especialmente na rede Chinesa de vídeos curtos, Tik Tok), para alguns é um fenômeno novo, enquanto para outros representa uma movimentação já bem conhecida, apenas com um novo nome.
O fenômeno que viralizou nos EUA, mas rapidamente se espalhou para outros países como o Brasil, já era conversado em espaços de trabalho de forma discreta, porém tomou forma e voz quando jovens passaram a falar a seu respeito, de forma cômica ou não, em vídeos curtos compartilhados em redes informais.
Mesmo com a existência comum (e normal) de colaboradores desengajados, a movimentação passou a chamar a atenção das lideranças de organizações justamente por trazer à tona o tema, chamando outras pessoas para o debate.
Inicialmente traduzido ao pé da letra no Brasil como “Demissão Silenciosa” e hoje substituído por “Desistência Silenciosa” (justamente porque não diz respeito a uma demissão efetiva, visto que as tarefas do trabalho continuam sendo cumpridas), refere-se à realização única do que se é exigido pela empresa com base no contrato estabelecido entre organização e colaborador, sem que o mesmo extrapole horas no trabalho, desenvolva grandes projetos ou assuma mais funções do que o previsto.
Protagonizado por jovens da Geração Z e Early Millennial, tem como princípio a ideia de que o colaborador deve realizar somente o suficiente para não ser desligado da organização, estabelecendo rígidos limites entre a vida pessoal e profissional, e tirando o trabalho do primeiro plano.
Para os jovens Quiet Quitters, expressões como “se matar de trabalhar” ou “dar o sangue pela empresa” não tem vez.
As consequências da pandemia
Apesar de comentarmos que o movimento circula em redes de trabalho há tempos, visto que sempre houve colaboradores desengajados, seu forte aparecimento não surgiu sem razões. Uma de suas principais raízes foi a Pandemia de Covid-19 ocorrida entre 2020 e 2021, que, no cenário brasileiro, manteve a população cerceada por praticamente dois anos e levou mais de meio milhão de pessoas ao óbito.
Em contexto de isolamento, fomos forçados a refletir sobre nossas vivências, dia a dia de trabalho, família e expectativas para o futuro. Além disso, a saúde mental — elemento que estava em jogo com o cerceamento de contato humano, passou a ser um tema de destaque, fortalecendo ideais como a importância de compreender os limites entre trabalho e vida pessoal (visto sua quebra com as experimentações urgentes e não testadas do modelo home office por muitas organizações), por exemplo.
Outro fator também associado à Pandemia que impactou a generalização de conversas sobre o fenômeno Quiet Quitting foi o aumento em casos de síndrome de Burnout. Essa classificação da síndrome pela OMS como Doença do Trabalho deu luz a outras neurodivergências não pautadas anteriormente: emerge um movimento exigindo proatividade das organizações frente ao cuidado mental dos colaboradores e gerando reflexões aos próprios colaboradores sobre a relação do trabalho com seu equilíbrio em saúde mental.
É possível afirmar, nesse contexto que o movimento Quiet Quitting se deu, então, como um ato reativo a ocorrências que desestabilizaram as condições de trabalho dos colaboradores, como:
- barreiras da pandemia;
- limites entre vida pessoal e trabalho quebrados pelo home office;
- déficits encontrados em saúde mental.
Quiet Quitting e Great Resignation
Além de suas raízes na pandemia e suas consequências no âmbito de saúde mental, o Quiet Quitting também foi associado pela mídia ao Great Resignation, conceito que descreve as demissões voluntárias em massa que ocorreram nos últimos anos, principalmente no início de 2021.
No movimento iniciado nos EUA, que rapidamente se espalhou para o mundo, muitas pessoas, mesmo sem ter outro trabalho em vista, pediram demissão como um indicativo de reivindicar melhores condições de trabalho. Elas buscavam a realização na função exercida, queriam cuidar da saúde mental e pretendiam ter mais tempo para focar em tarefas de seu interesse.
Apesar do vínculo entre a ocorrência do fenômeno nos EUA e aqui no Brasil, é importante ter consciência das diferenças de seu caráter em seu polo de nascimento e aqui. Nos EUA, pessoas de muitos perfis pediram demissão para reivindicar melhores condições de trabalho, enquanto no Brasil a adesão ao movimento ocorreu de uma camada mais privilegiada, em áreas com menor desemprego (como tecnologia) e por pessoas com maior segurança financeira para tal resolução.
O Quiet Quitting passou, então, a ser visto com uma continuação do movimento de Great Resignation, seus objetivos e as expectativas dos colaboradores nele envolvidos. Entretanto, segundo o relatório “Q2 2022: United States Job Market Report” da Joblist, no Great Resignation, ao mesmo passo que muitos pediram demissão, houve grande arrependimento daqueles que tomaram a decisão por conta de uma perspectiva iminente de recessão (1 a cada 4 colaboradores alegaram arrependimento). Muitos profissionais que se demitiram não conseguiram se recolocar no mercado como o previsto ou até acabaram, por necessidade, se recolocando em empregos que também não contemplavam seu propósito, nem traziam a realização profissional esperada.
Assim, o Quiet Quitting surgiu não como continuação, mas como uma adaptação ao cenário visto no Great Resignation. Muitas pessoas que se arrependeram da decisão da demissão e não a fariam novamente, aqueles que desde o princípio não puderam se demitir ou os que não se sentiram confortáveis com a demissão como saída, passaram a não mais sair das empresas, mas diminuir o nível de produtividade no trabalho.
Existe um vilão?
Enquanto tema de alta especulação na mídia, não seria de se esperar menos do que opiniões polêmicas sobre seu funcionamento e movimentações para encontrar os culpados ou “vilões” da história.
Apesar de estar sendo tratado de muitas formas pelos veículos de comunicação, seja considerando um cenário social e amplo ou até afunilado e personalizado, duas opiniões têm sido o carro-chefe das discussões sobre Quiet Quitting: uma culpabilizando os colaboradores que aderiram o movimento e outra culpabilizando as organizações.
Na primeira perspectiva:
- colaboradores são vistos como preguiçosos e desinteressados;
- acreditam que esses colaboradores se arrependerão no futuro de suas carreiras (lógica punitivista);
- culpabilizam os jovens: Geração Z e Early Millennial (etarismo).
Em contrapartida, na segunda perspectiva vemos uma narrativa de culpabilização da organização, colocando o sujeito como ser passivo na situação:
- culpabilização apenas a organização;
- colaborador como sujeito passivo;
- culpabilização da empresa, da liderança direta, do design organizacional, do modelo de trabalho.
De maneira geral, mesmo com as duas perspectivas em evidência, ainda não há uma resposta concreta, muito menos definitiva sobre os agentes do tema.
O impacto geracional
Um ponto que também se faz importante para essa conversa é o etarismo (discriminação de grupos com base na idade) nas críticas que culpabilizam o colaborador, visto o protagonismo jovem no fenômeno. Não há como negar que o fator geracional é de forte impacto ao fenômeno.
Conforme a mudança de gerações incidentes no mercado de trabalho, mudam-se as demandas, modelos e formatos de atuação. Um grande exemplo disso é o marcante perfil dos Babies Boomers, geração dos nascidos de 1945 a 1964, um momento de complexa geopolítica, após a Segunda Guerra Mundial. Como consequência das inseguranças e crises da época, os colaboradores da geração visam estabilidade no trabalho, com vagas fixas, que os deem visão de crescimento, futuro e confortável aposentadoria.
Já a Geração Z, que iniciou sua entrada no mercado de trabalho em meados de 2015 até o momento, vem com demandas bem distintas das anteriores. Diferindo-se de outros grupos, em questão de prioridades, para ela o alinhamento com propósitos e valores da organização, o interesse em fazer a diferença, são quesitos básicos para a escolha da carreira e vínculo com a empresa.
Segundo o Panorama da Experiência do Colaborador 2021-2022, com exceção dos Baby Boomers, as gerações seguintes, especialmente Millennials e Geração Z, demonstram maior ímpeto de mudança de área e trabalho conforme o não atendimento de suas expectativas ou demandas. Além disso, o mesmo relatório reporta que, para os colaboradores da geração Z, Saúde Mental foi um tema de forte favorabilidade, demonstrando o zelo da geração por tal pauta.
Além da relação com a empresa, que por si só se mostra diferente das restantes, a geração também demonstra forte apego às boas experiências e aprendizados, apresentando uma calorosa busca pelo equilíbrio em âmbitos de vida que vão muito além do trabalho.
Assim, entende-se ser mais que essencial compreender não só a adesão dos Early Millennials e Geração Z ao fenômeno através de uma lente etarista, que julga as atitudes do fenômeno como descaso juvenil ao trabalho, mas também entender como as gerações mudam e repensam formatos de trabalho, além de como trabalho pode se adequar a essas necessidades e mudanças.
A lente de EX
Já pudemos compreender que as causas para o fortalecimento desse fenômeno são muitas e que não se pode culpar algo ou alguém, exclusivamente, por ele. Então, como compreendê-lo e, assim, poder planejar ações resolutivas?
O que sabemos com clareza é que tudo isso está relacionado (e, consequentemente, gera uma necessidade de cuidado) ao engajamento e experiência do colaborador na organização.
Com base nisso, a ideia a ser proposta é pensar em Quiet Quitting sob a ótica de Employee Experience, questionando soluções rápidas e a culpabilização de apenas um lado da história. Pela perspectiva de EX partimos da ideia de que o fenômeno é multifatorial.
Para EX, o engajamento ocorre como resultado da experiência do colaborador na organização e essa experiência envolve muitos fatores, tanto relacionados à empresa (o ambiente de trabalho, os benefícios, as demandas) quanto ao próprio colaborador (sua intenção de crescimento na organização, sua disponibilidade de aprendizado, a influência de seus fatores pessoais no trabalho).
O engajamento então ocorre com o alinhamento entre as necessidades, ofertas e expectativas do colaborador e da organização. Quanto maior o alinhamento entre os dois, melhor a experiência do colaborador, sua relação com a empresa e, consequentemente, seu engajamento, da mesma forma que quanto maior o distanciamento entre os dois, maior o gap de experiência e menor o engajamento.
Outro ponto importante é que, tendo em vista que o colaborador é um agente ativo de sua experiência e que cada colaborador é uma pessoa única, cada experiência na sua organização será também única! Poderá haver similaridades entre demandas de determinados grupos, mas a cautela e alinhamento assertivos com a jornada de cada um devem considerar experiências personalizadas.
Cabe então à organização observar seus colaboradores e adaptar o possível para a melhor experiência. Por exemplo, você pode ter um colaborador focado em metas, carreira e que vai dar um pouco mais de si no trabalho para atingir certo cargo de seu interesse. Nessa situação, o papel da organização é:
- fornecer orientação e o caminho para que o colaborador possa se desenvolver ali dentro;
- manter o acompanhamento de sua jornada para garantir que ele não extrapole seus limites em prol do trabalho.
Ao mesmo passo, você pode ter outro colaborador, Quiet Quitter, que faz apenas o necessário de sua vaga. Nessa situação, a organização deve entender o contexto e sua gravidade. Esse funcionário, nessa vaga, fazendo somente o mínimo, é um problema para o funcionamento da organização? Se a resposta for não, não há problema em relação ao fenômeno na sua organização. O time de RH ainda terá o papel de atuar buscando engajar mais esse e outros colaboradores, mas o Quiet Quitting em si não será o foco de seu problema.
Agora, se a resposta for sim, será mais que essencial uma análise dos dois lados da história, para entender não só o colaborador, mas também se há falhas da organização (o colaborador está excedendo horas no trabalho e se desgastando com isso? Está desengajado por problemas com a liderança? Está com problemas pessoais?). A partir dessas análises, você poderá pensar em ações para a resolução dessa situação.
É através de pesquisas e análises de dados na organização que você conseguirá manter o alinhamento com as expectativas, comentários e sentimentos dos colaboradores e, assim, saberá onde se encontram suas maiores dores e dificuldades, para poder agir com direcionamento em busca de melhores resultados e experiências!
Como a Pin People pode te ajudar!
Através da pesquisa de eNPS da Pin People, você poderá observar cada passo da jornada de seus colaboradores com dados qualitativos e quantitativos, filtrando resultados, identificando o percentual de detratores, promotores e neutros, e compreendendo seus pontos fracos e fortes em relação à organização com a Análise de Sentimentos. Assim, compreender o impacto do desengajamento na sua organização não será uma tarefa árdua!
Por meio da solução de Clima e Engajamento Organizacional, aplicada através de Pulsos, você também poderá receber insights, de forma estratificada e em tempo real, sobre o engajamento de colaboradores com alto nível de adesão, permitindo o desenvolvimento assertivo de planos de ação, com foco naqueles que visam crescimento e uma jornada de longo prazo na sua organização!
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Com base em tudo o que foi comentado até agora, entendemos que a resposta para combater o Quiet Quitting é o alinhamento constante entre organização e seus colaboradores, mediado por um conjunto de pesquisas, com análises das experiências ali presentes, considerando o impacto geracional no trabalho.
Assim, é necessário:
- entender constantemente como está a experiência dos seus colaboradores, com base em suas potencialidades individuais e geração, analisando o Quiet Quitting e outros fenômenos através de uma lente crítica, questionando se realmente há um problema em relação a isso e, se sim, como ele está se desdobrando e quais suas causas, para que ações sejam tomadas;
- manter pesquisas frequentes para observar e analisar junto ao time de Recursos Humanos, as dores e pontos fortes expostos por suas pessoas.
Através do alinhamento e cuidado com seus colaboradores, o Quiet Quitting não passará de uma história!
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